quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Fechar os olhos do corpo para abrir os da alma


No inicio de minha caminhada, O Senhor me deu uma Palavra que guardei com muita alegria. Nessa Palavra O Senhor afirmava que outros viriam para caminhar comigo no ministério da Musica e da oração. Isso se cumpriu. Vieram o Nenê e sua esposa Palmira.
Começamos a cantar juntos, orar e evangelizar onde quer que nos chamassem.
Éramos animados pelo mesmo espírito. Foram muitos anos juntos. Porém quando fomos para Poá, eles caminharam por algum tempo, mas não permaneceram, pois era uma distancia considerável para se percorrer varias vezes na semana.
Ficaram na comunidade Nossa Senhora Auxiliadora, que era uma extensão do terreno de sua casa e que eles doaram para a Paróquia Nossa Senhora da glória, onde eu comecei minha caminhada de renovação carismática em Junho de 1992.
Numa terça feira fui convidado a pregar no Grupo de Oração dessa Comunidade.
O Nenê estava tocando e a Palmira cantava e conduzia a oração.
Quando me deram a oportunidade, tomei minha Bíblia e preguei sobre o sofrimento, a dor, a perda, a perseverança, a vitória e a recompensa de Jó. No final a Palmira veio comentar que havia gostado muito da palestra e que fora uma colocação muito boa, que Deus é fiel e sempre nos dá a paga pelas obras geradas a partir de nossa fé.
Três meses depois ela estava internada na Santa casa de misericórdia de São Paulo com Metástase. O que se pensou ser uma inflamação no nervo ciático, era na verdade um câncer violentíssimo e impiedoso. Ele se alastrou nos órgãos internos com uma velocidade impressionante. Seu esposo, o Nenê, meu amigo, irmão, companheiro, estava inconformado, inconsolável e sofrendo de uma forma de dar dó.
A relação dos dois era algo como eu nunca tinha visto. O amor entre eles era de dar inveja na maioria dos casais. Ela o tratava com uma ternura indescritível e ele a ela.
Não dava para imaginá-los separados, nem pela morte.
Até então eu não a havia visitado no hospital.
Tendo pois, combinado ir visitá-la como o Nenê, fui a sua casa para pegá-lo. Quando lá cheguei, encontrei-o radiante, feliz. Com a bíblia aberta na mão, me mostrava um trecho de um texto no Livro de Isaias que ele lia após orar. Essa Palavra era uma promessa de Deus que prometia restaurar, curar totalmente e libertar seu povo. Apontando para o quintal me mostrou uma arvorezinha fina de uns dois metros de altura e uns dois centímetros de espessura em seu tronco, uma vara para melhor me fazer entender. Ela estava ali já havia muito tempo, mas era uma arvore que fora plantada e morreu, não vingou. Mas ali, naquele dia, estava com folhas verdes em seu topo. Essa arvore voltou a vida, dizia...
A Palmira plantou essa arvore faz mais de um ano e agora ela ressuscitou, é um sinal de Deus!
Céptico como Deus sabe que sou em relação as coisas fantásticas, pensei em pelo menos três razões para aquela arvore ter-se revitalizado.
A quarta razão seria um sinal divino.
Mas senti em meu coração que aquela Palavra dizia muito mais do que se lia.
Lembrei-me de Lázaro que fora ressuscitado por Jesus, viveu provavelmente até a velhice, mas não escapou da morte para sempre, teve que morrer novamente para poder viver para sempre junto de seu amigo Nazareno. Pensei no meu intimo que Deus falava realmente, mas falava de cura, não somente do corpo, mas da alma. A carne judiada e maltratada pelo câncer era uma prisão e Deus iria curá-la, iria libertá-la.
Mas como eu poderia falar uma coisa dessas para ele, radiante como estava?
Se eu falasse, seria um banho de água fria. Por isso nada falei.
Seguimos para o Hospital e durante todo o trajeto ele foi falando dos seus planos para o dia que a esposa voltasse do hospital, curada.
O que mudaria, como seria a vida depois dessa experiência, como testemunhariam tanta maravilha. Meu coração apertado, parecia que iria pular do meu peito em saber que em breve ele descobriria que havia interpretado a Palavra como lhe era oportuno e por isso não a compreendeu de fato.
Entrei no quarto com ele e ela estava deitada sobre a cama, dizendo que o médico havia passado e dito que ela estava melhor. Ele queria saber se ela já estava de alta e se poderia ir embora com ele. Ela respondeu que achava que não, que o médico não havia dito nada sobre isso.Depois de alguns momentos ela pediu a ele que a deixasse falar comigo. A sós, segurou minha mão com força nas suas e com um olhar suplicante me pediu para dar força a ele e cuidar dele. Para não deixar que ele desistisse da caminhada. Aos pedaços eu concordei e a abracei.
Alguns dias se passaram até que a mandaram para casa.
Todos os dias havia oração, ela rezava o Rosário e recebia a Eucaristia. Foram quatro meses de Comunhão diária, inclusive no hospital ela comungava todos os dias.
Os dias foram passando e ela foi ficando mais fraca. A voz tão linda que louvara ao Senhor por tanto tempo já não se ouvia mais e a cada dia se tornava mais baixa e fraca, tornando-se nada mais que um gemido quase inaudível.
Padre Léo, antes de falecer, em sua ultima pregação (Buscai as coisas do alto), disse que a pessoa que sofre as dores do câncer aqui na terra, está liberada do purgatório no ceu. Eu concordo com ele, porque não existe humilhação e sofrimento pior que o câncer na vida de um ser humano! Vai embora tudo o que a pessoa tinha e era, inclusive a dignidade de tomar banho e se limpar sozinho.
Numa certa manhã, ela estava muito bem, bem mesmo. Parecia que não havia mais doença.
Ela estava feliz. Orou, comungou e a voz, a bela voz, lhe foi concedida ainda mais uma vez.
Ela aproveitou a voz e puxando o coro cantou pra Deus pela ultima e derradeira vez, nesta vida...

Não há Deus Maior
Não há Deus Melhor
Não há Deus tão grande
Como nosso Deus...

Todos cantando juntos, um grande louvor a Deus aconteceu naquele instante e a Glória de Deus encheu aquele lugar.
Um pouco mais tarde, ela descansava em sua cama quando disse:
“Maria está aqui”
Foi a ultima coisa que ela disse antes de fechar os olhos do corpo para abrir os olhos da alma e ver A Face de Deus e de Seu Cristo, guiada pelas mãos amorosas e maternas da Bem Aventurada Virgem.
Quando eu cheguei ao velório, que foi realizado dentro da comunidade Nossa Senhora Auxiliadora. Não suportei ver o Nenê sentado ao lado do corpo que jazia no caixão posicionado com sua cabeceira centralizada na fronte do altar, chorando, desesperado. Vi em seus olhos o desejo de estar morto naquele momento, mas vi também um homem que mais parecia uma criança que perdera e chorava por sua mãe. Ele esperou pela suposta promessa de seu Deus, que não se cumpriu. Ele quase desistiu da vida, de Deus, de tudo. Ele pediu a morte, mas ela não veio. Disse-me uma vez que nem a morte o queria.
Sua vida não tinha mais sentido. De Deus de amor, para ele, em seu coração, Deus se tornara cruel e o abandonara. Mas Deus, que continuou sendo Amor e amando-o, não o desamparou e não o abandonou. Não deixou de consolá-lo e de sofrer com sua dor.
Sonhei com ela duas ou três vezes. No primeiro sonho eu a vi e pedi a ela que intercedesse junto a Jesus por nós e obtive a resposta imediata: “Já estou intercedendo”.
No segundo ela estava num lugar alto e eu pedi a mesma coisa e obtive a mesma resposta.
Confesso que, com exceção de São Miguel Arcanjo, que é espírito e sempre o foi, e Maria, que é Mãe de Jesus e isso não é pouca coisa, eu nunca coloquei fé em ninguém que partiu daqui, apesar de ser muitíssimo fã de São Francisco de Assis. Mas esses sonhos me fizeram repensar ou ao menos gerou uma duvida em meu coração.

"Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso"(Lc 23,43).


Quando contei a ele os sonhos que tive com ela, ele se mostrou enciumado, desapontado e triste. Disse-me que nunca sonhou com ela depois de seu falecimento, que quiz muito, mas nunca sonhou.
Entendi que, Deus o poupava do sofrimento e deixava que aos poucos ele se desapegasse, porque esquecer seria mesmo impossível.
Hoje ele continua tocando na comunidade Nossa Senhora Auxiliadora e em uma missa rural em Salesópoles e caminha com Deus a cada dia, sabendo que entre ele a a Palmira está Deus que lhe permitiu viver todos aqueles anos de amor, alegria e felicidade. Que o sentimento que deve nutrir diante de Deus é o da gratidão pelo presente em sua vida.
Depois de tudo isso aprendi uma lição. Todas as vezes que fui orar por enfermos que estavam próximos de morrer, a Palavra me confirmava. Sempre, sempre. Mas eu não sabia bem como administrar isso. Hoje, se isso acontecer, como já aconteceu, eu direciono a oração e a meditação da Palavra para a preparação da alma que vai ao encontro de Deus, recomendo em caráter de urgência os Sacramentos da confissão, Eucaristia e Unção dos Enfermos.
Não escondo, não quero me sentir culpado por não avisar, pois somos omissos como batizados e profetas, se não anunciamos a salvação em Cristo jesus enquanto o irmão tem tempo.
Sei que é mui difícil estar pronto para a morte, mas com a Graça do Espírito Santo conseguiremos.

Disse-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, ainda que esteja morto, viverá. (São João 11,25)

Paz e bênçãos.

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